O PROBLEMA DA VIOLÊNCIA

Um texto de mais de 30 anos... Precisamos da religião, não em seu sentido formal — de mera frequência aos templos —, mas como luz a mostrar além dos efêmeros interesses da Terra. Nada de aceitação passiva, mas uma certeza apoiada na lógica e na razão.

A ação do livro "Nosso Lar", de André Luiz, psicografia de Francisco Cândido Xavier, decorre no período de agressões da Alemanha nazista, que culminou com a Segunda Guerra Mundial.

O autor reporta-se em vários capítulos às preocupações dos Espíritos com o conflito, situação semelhante às pessoas que, residindo no Brasil, na época, tinham familiares na Europa. E descreve a mobilização de trabalhadores do Além para socorrer as vítimas das batalhas e neutralizar pelo menos em parte a influência de forças do Mal, que se assenhoreiam do Homem quando ele mergulha na loucura da guerra.

Um desses abnegados enfermeiros, o ministro Benevenuto, comenta:

"Nunca, como na guerra, evidencia o Espírito Humano a condição de Alma decaída, apresentando características essencialmente diabólicas. Vi homens inteligentes e instruídos localizarem, com minuciosa atenção, determinados setores de atividade pacífica, para o que chamam "impactos diretos". Bombas de alto poder explosivo destroem edifícios pacientemente construídos. Aos fluidos venenosos da metralha, casam-se as emanações pestilentas do ódio e tornam quase impossível qualquer auxílio."

A expressão "Alma decaída" define bem a condição de rebeldia que caracteriza o comportamento humano, a manifestar-se em ondas de violência coletiva, como numa guerra, ou individual, como num assalto, ofensa ou discussão. A agressividade, a tendência para resolver seus problemas apelando para a força, é bem própria ainda da natureza humana, a evidenciar seu profundo atraso moral.

E hoje, mais do que nunca, prevalece a lei do mais forte, transformada em fator de autoafirmação para governos e indivíduos, com total desrespeito pela ordem e pelo Direito.

"Quais as causas dessa atual onda de criminalidade, tanto no campo individual como no coletivo?"

A pergunta é feita por Arnold J. Toynbee, considerado um dos maiores historiadores dos tempos modernos. E ele mesmo responde:

"Talvez a razão fundamental seja a perda da Religião.  Deixamos de acreditar nas formas convencionais de religião e não encontramos novas alternativas. Vivemos num vácuo religioso. E, talvez, em grande parte por esse motivo, os padrões tradicionais e os códigos de ética perderam sua força. Esse colapso espiritual surgiu nas duas guerras mundiais, cujos efeitos foram cumulativos. As guerras abriram as comportas da onda de violência que hoje se derrama sobre o Mundo."

O Homem viveu durante muito tempo preso ao formalismo religioso, à mera frequência às igrejas, como cumprimento de uma obrigação herdada dos pais, submetendo-se às práticas e costumes muito mais por imposição do que por convicções autênticas. Por isso, na medida em que amadureceu intelectualmente, superando condicionamentos seculares, desligou-se da Religião, simplesmente porque ela já não atende seus anseios e necessidades.

Este fenômeno é observado com maior intensidade nos grandes centros urbanos, onde o indivíduo, motivado pelo desejo de desfrutar conforto e segurança, em base de enriquecimento e prestígio, multiplica-se em negócios e interesses relacionados com dinheiro e poder.

Isto é muito grave, porquanto na medida em que o Homem passa a viver em função exclusivamente de interesses imediatistas, sem nenhuma cogitação de ordem espiritualizante, perde o controle dos impulsos agressivos que ainda o caracterizam, e a violência torna-se a primeira consequência desse vácuo religioso a que se refere Toynbee.

A mesma definição é apresentada por André Luiz quando, procurando explicar o fenômeno da violência, diz, pelo mesmo Benevenuto: "Falta de preparação religiosa. Não basta ao Homem inteligência apurada. É-lhe necessário iluminar os raciocínios para a Vida Eterna".

Mais do que nunca, em face da conturbação atual, o Homem tem necessidade de uma religião, não em seu sentido formal, o mero comparecimento às igrejas para cumprimento de cultos exteriores, mas como luz que se projete sobre sua mente, dando-lhe um objetivo para a Vida que se estenda além dos efêmeros interesses da Terra, com uma consciência de imortalidade, que não seja apenas uma questão de crença, inspirada na capacidade de aceitação, mas uma certeza apoiada na lógica e na razão.

Não diremos que essa religião é o Espiritismo, porquanto proclamar que a violência somente será eliminada da face da Terra quando todos formos espíritas, seria uma afirmação tão sectária e tola quanto aquela defendida pelos sacerdotes católicos no passado, segundo a qual "fora da Igreja não há salvação".

Não seremos todos espíritas ou católicos, nem budistas ou protestantes, em futuro próximo ou remoto, porquanto, por muitos séculos teremos Espíritos na Terra em diferentes estágios evolutivos e com diferentes motivações culturais e sociais.

Mas podemos afirmar, com certeza, que a Doutrina Espírita está na vanguarda de todos os movimentos libertadores da consciência humana. E princípios como a Reencarnação e a Lei de Causa e Efeito, que definem a atuação de Leis Divinas que disciplinam a evolução do Espírito, forçosamente serão assimilados por todas as religiões, que não tardarão em cultivar o intercâmbio com o Além, a conversa com os "mortos", oferecendo, assim, ao Homem, uma substância de conhecimento e uma certeza de continuidade da vida que o motivem suficientemente para que se decida a lutar contra suas tendências inferiores, consciente de que do seu esforço por se melhorar depende sua felicidade.

Quando a contenção da violência deixar de ser um problema policial e se transformar em questão de disciplina do próprio indivíduo; quando a paz for produto não da imposição de leis humanas, mas da observância coletiva das Leis Divinas, então viveremos num Mundo melhor.

Richard Simonetti

(do livro Temas de hoje, problemas de sempre. Ed. Correio Fraterno)

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