A armadura de ouro

Havia um grande rei que possuía imensos domínios e um ilimitado poder sobre seus súditos. Tudo o que desejava tinha sob a mão e sua vida era um contínuo desfilar de prazeres materiais...

Havia um grande rei que possuía imensos domínios e um ilimitado poder sobre seus súditos.  Tudo o que desejava tinha sob a mão e sua vida era um contínuo desfilar de prazeres materiais.

Um dia, para maior glória de sua grandeza, requisitou todo o ouro que havia no reino e mandou fazer uma armadura recamada de brilhantes de alto custo e pureza.  Seus armeiros fizeram um verdadeiro trabalho de arte.  A corte se extasiou, tecendo os bajuladores intermináveis ditirambos (1) ao monarca.  O grande rei não se continha de tanta vaidade e desejoso de usar a maravilha de ourivesaria resolveu fazer uma guerra.

Convocou o Estado Maior, aparelhou todo o exército e sob o pretexto que o soberano vizinho havia dito ser sua armadura de ferro mais bonita que a sua de ouro, atravessou o grande rio que limitava suas terras, dando início à invasão.

Como avassaladora onda, seus valentes soldados apoiados por pesados carros de guerra assolaram e talaram as terras inimigas.  E o grande rei já se julgava vencedor, quando as portas dos céus se abriram num verdadeiro dilúvio.  Os carros atolaram-se até os eixos e a cavalaria perdeu a mobilidade na lama viscosa e inconsistente.  E começou a derrota.  O rei, chorando de raiva, impotente, ordenou a retirada.  Lentamente foi-se deslocando batido pelos elementos e pelas emboscadas dos adversários.  Por fim, pôs-se em fuga com seus oficiais.

Nos limites de suas terras, teve, porém, terrível surpresa.  O rio assoberbado pela cheia havia levado todas as pontes.

— Que fazer?

Dirigindo-se aos oficiais, confessou:

— Não sei nadar.  Qual de vós me levará ao outro lado?

Cabisbaixos, os bravos soldados ficaram silenciosos.  Nenhum deles também sabia nadar.

Foi quando uma voz de um escravo se fez ouvir.

— Senhor, eu o levarei ao outro lado.

— Tu! – exclamou o rei vacilando.  — Então vamos – disse-lhe o soberano desmontando.

— E a armadura? Vossa Majestade tem que tirá-la.  Ela pesa muito e com certeza nos levaria para o fundo do rio.

— Nunca! – exclamou voltando ao corcel. — Antes a morte do que deixar minha armadura de ouro nas mãos dos meus inimigos.

E o grande rei, enristando a lança, à frente do punhado de bravos que lhe restava, lançou-se à luta.

Hildebrando de Lima (do livro Parábolas Espiritualistas – Ed. Pensamento)

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(1) Homenagens

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