A ARMA INFALÍVEL

Certo dia, um homem revoltado criou um poderoso e longo pensamento de ódio, colocou-o numa carta rude e malcriada e mandou-a para o chefe da oficina de que fora despedido...

Neio Lúcio (em Alvorada Cristã)

Certo dia, um homem revoltado criou um poderoso e longo pensamento de ódio, colocou-o numa carta rude e malcriada e mandou-a para o chefe da oficina de que fora despedido.

O pensamento foi vazado em forma de ameaças cruéis.  E quando o diretor do serviço leu as frases ingratas que o expressava, acolheu-o, desprevenidamente, no próprio coração, e tornou-se furioso sem saber por quê.  Encontrou, quase de imediato, o subchefe da oficina e, a pretexto de enxergar uma peça quebrada, desfechou sobre ele a bomba mental que trazia consigo.

Foi a vez do subchefe tornar-se neurastênico, sem dar o motivo.  Abrigou a projeção maléfica no sentimento, permaneceu amuado várias horas e, no instante do almoço, ao invés de alimentar-se, descarregou na esposa o perigoso dardo intangível.  Tão-só por ver um sapato imperfeitamente engraxado, proferiu dezenas de palavras feias;  sentiu-se aliviado e a mulher passou a asilar no peito a odienta vibração, em forma de cólera inexplicável.  Repentinamente transtornada pelo raio que a ferira e que, até ali ninguém soubera remover, encaminhou-se para a empregada que se incumbia do serviço de calçados e desabafou.  Com palavras indesejáveis inoculou-lhe no coração o estilete invisível.

Agora, era uma pobre menina quem detinha o tóxico mental.  Não podendo despejá-lo nos pratos e xícaras ao alcance de suas mãos, em vista do enorme débito em dinheiro que seria compelida a aceitar, acercou-se de velho cão, dorminhoco e paciente, e transferiu-lhe o veneno imponderável num pontapé de largas proporções.

O animal ganiu e disparou, tocado pela energia mortífera, e, para livrar-se desta, mordeu a primeira pessoa que encontrou na via pública.

Era a senhora de um proprietário vizinho que, ferida na coxa, se enfureceu instantaneamente, possuída pela força maléfica.  Em gritaria desesperada, foi conduzida a certa farmácia; entretanto, deu-se pressa em transferir ao enfermeiro que a socorria a vibração amaldiçoada.  Crivou-o de xingamentos e esbofeteou-lhe o rosto.

O rapaz muito prestativo, de calmo que era converteu-se em fera verdadeira.  Revidou os golpes recebidos com observações ásperas e saiu, alucinado, para a residência, onde a velha e devotada mãezinha o esperava para a refeição da tarde.  Chegou e descarregou sobre ela toda a ira de que era portador.

— Estou farto! – bradou.  — A senhora é culpada dos aborrecimentos que me perseguem!  Não suporto mais esta vida infeliz!  Fuja de minha frente!...

Pronunciou nomes terríveis.  Blasfemou.  Gritou, colérico, qual louco.
A velhinha, porém, longe de agastar-se, tomou-lhe as mãos e disse-lhe com naturalidade e brandura:

— Venha cá, meu filho! Você está cansado e doente!  Sei a extensão de seus sacrifícios por mim e reconheço que tem razão para lamentar-se.  No entanto, tenhamos bom ânimo! Lembremo-nos de Jesus!... Tudo passa na Terra.  Não nos esqueçamos do amor que o Mestre nos legou...

Abraçou-o, comovida, e afagou-lhe os cabelos!

O filho demorou-se a contemplar-lhe os olhos serenos e reconheceu que havia no carinho materno tanto perdão e tanto entendimento, que começou a chorar, pedindo-lhe desculpas.

Houve então entre os dois uma explosão de íntimas alegrias.  Jantaram felizes e oraram em sinal de reconhecimento a Deus.

A projeção destrutiva do ódio morrera, afinal, ali, dentro do lar humilde, diante da força infalível e sublime do amor.

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