TEXTOS DO AUTOR

UMA NOIVA DA PESADA

Arrumar o sótão e retirar os entulhos era trabalho para o Ni, que apresentou uma solução criativa. E surpreendente.

Eram duas coisas inadiáveis a se fazer. Arrumar o sótão e retirar os entulhos que ficaram entre a laje e o telhado desde a época da construção, vinte e sete anos passados. Quanto ao sótão, a verdade insofismável é que guardamos coisas demais. Geralmente nunca vamos precisar delas. Apego exagerado. Às vezes desleixo mesmo.

Ni, o jardineiro, sempre foi habilidoso para tarefas assim. O melhor de tudo é que fazia bicos nos fins de semana. E podia fugir sem problemas da sua linha da jardinagem.

Como eu tinha ideia exata do volume grande de trabalho, sugeri que Ni trouxesse seu irmão para ajudar. Não foi uma nem duas vezes que ele chegou com o irmão. Ficou combinado assim.

No sábado de manhã, qual não foi a surpresa: Ni chegou com o sorriso de sempre, mas com uma moça em vez do irmão. Estranhei, mas ele foi logo se justificando. E argumentando: "Meu irmão teve um compromisso. Esta é minha noiva, a Flávia. Ela trabalha que nem gente grande. Pode ficar tranquilo". Claro que não acreditei que a moça substituísse o irmão à altura. Só pensei comigo: que presente para a noivinha... de grego.

Bem, não era bem uma noivinha. Um pouquinho mais alta que ele. Semblante decidido. Um pouquinho mais forte? não sei... Ni é pequeno.

Quando o trabalho começou, as dúvidas logo se dissiparam. Entendendo rapidamente a metodologia, Flávia botou mãos à obra. Varria, juntava, raspava, sugeria, carregava.  Já o Ni, era ele quem descia do primeiro andar com as latas de entulho até o contêiner.  De repente, a noiva não deixou por menos: começou a descer também com o material. Lata pesada que só chumbo.

E assim foi até as cinco da tarde, só pararam para almoçar e conversar abobrinhas.  Ninguém é de ferro, nem Ni, nem a noiva. Mas o casal era quase de ferro. Qual o mais esperto no trabalho? Difícil dizer. E comemoramos o término da empreitada. Conseguimos tudo a contento. Metade do contêiner ficou lotado de pedaços de telha e restos de construção. Trabalho de gente de muque!

Uma toalha para a Flávia, uma toalha para o Ni. Como é bem-vindo um banho depois de se comer tanta poeira. Enquanto ela entrou no banheiro, fui procurar o Ni para acertar o combinado. Atrás da casa, nada. Na frente, nada. Será que está no sótão? Nada.  Onde estaria?

Foi quando ouvi a voz do Ni. Vinha lá dos lados do banheiro... claro, estava no banho junto com a noiva. Quando saiu, ao nos despedirmos, paguei, agradeci. Ele então disse: "Viu como ela trabalha? O que achou?". Meu comentário não passou disto: "Bem, ela é ótima, parabéns! Mas reparei numa coisa, você nunca toma banho com seu irmão".

Aristides Coelho Neto, 22.8.2009

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