TEXTOS DO AUTOR

DOUTORA, SUGIRA ALGUMA COISA...

Gente dizendo que é malhar em ferro frio. Mas no caso dos tão falados assaltos a ônibus sem solução, o poemeto de Mário Roberto foi a gota d´água para buscar a psicanalista... que na verdade nem era.

Boa tarde, doutora Fernanda. Onde é o divã? Ah! é cadeira mesmo. Então, tudo bem...

Obrigado, estou à vontade. Antes de mais nada queria dizer que três pessoas andaram comentando comigo os acontecimentos do assalto a ônibus do qual participei. Sim, como vítima, claro! Não poderia ser de outro jeito, o que pensou? Se estou dormindo bem? Do mesmo jeito, eu já não dormia bem.

Os três comentários (hoje em dia, em vez de comentários, dizem “colocações”, argh!) me incitam a que eu pare de falar no assunto de assalto a ônibus. E que deixe tudo pra lá.

Duas dessas pessoas são amigas. A outra é desconhecida, veio pelas vias da web.

O poemeto do meu amigo Mário Roberto mexeu comigo. É a força que a poesia tem, não é mesmo? Os versos dizem de trauma. E eu preciso da sua orientação. Se tiver paciência, vou lhe falar do que disseram as três pessoas. Prometo ser sucinto.

 

Deixa-disso 1

Olha, Ari, aqui, ali, ou aí,
Esquece logo isso
Antes que vire trauma,
Não arrancas compromisso,
Não sensibilizas um'alma...
Para alguns é papo ermo,
Inclusive pro governo.

Esquece logo o assunto,
É malhar em frio...
Cisma de macho valente,
Por sorte não és defunto.
Mas a guerra já foi ganha,
Nem a polícia dá jeito,
Nem o papa, nem prefeito,
Ninguém faz essa façanha.

Viaje de carro mesmo...
Condicionado no ar,
Somente durante o dia,
Com pururuca e torresmo,
Coca-cola e guaraná.
Nem sequer pense em regime,
Economizas mais cobres,
E não promoves os mais nobres,
Recompensados no crime.

ass. Mário Roberto

 

Deixa-disso 2

Ari, não viajo de ônibus desde 2000, quando, voltando pela Itapemirim de Marília, passei pela mesma experiência. Depois de muito transtorno e de saber pela polícia rodoviária que éramos os terceiros a sofrer assalto naquela noite, chegamos à rodoferroviária em Brasília e recebemos da empresa Itapemirim um vale-transporte para que fôssemos para casa e olhe lá. Tentamos processar a empresa e recebemos a sugestão de esquecer o fato, pois os únicos prejudicados seríamos nós, já que a empresa é muito mais poderosa. Esses assaltos já foram noticiados várias vezes pela TV. Acontecem há anos. Já tive alguns amigos que passaram por essa experiência. A solução que encontrei foi de nunca mais entrar num ônibus desses.

Talvez não seja a melhor atitude, mas não encontrei outra saída. Tomara que seu panfleto surta efeito e essas empresas tomem vergonha e encontrem uma forma de proteger seus clientes.

Apesar de tudo, um 2009 repleto de alegrias e realizações. ass. Zeli

 

Deixa-disso 3

O terceiro comentário veio de uma pessoa que havia lido um dos cinco mil panfletos de utilidade pública que eu distribuíra na rodoferroviária. Disse que vinha estudando essa questão há tempo. E não vislumbrava grandes soluções. Disse de meu foco de desabafo e cobrança um tanto equivocado, segundo ele. Isso para dizer, em resumo, que as empresas são tão vítimas quanto os passageiros do descaso do governo. E detalhou isso. Disse do engessamento das empresas, prestadoras de serviço público para o Estado, aquele que detém todo o controle do segmento de transportes, por meio do Ministério dos Transportes e da ANTT. Falou da inviabilidade de segurança armada, de viajar em comboio, de rádio-comunicação, de rastreamento via satélite, do seu alto custo. Disse de crise econômica por que passam as empresas. Falou de concessões que se dá para idosos e portadores de necessidades especiais para viajar de ônibus, num tratamento desigual em relação a viagens de avião. Nestas últimas, nenhuma concessão para ninguém.

E fez uma comparação com supermercados. Que estes iriam à falência se o governo decretasse que cada idoso ou portador de algum tipo de deficiência tivesse direito a 5 kg de arroz de graça... Falou das consequências nefastas do crescente transporte clandestino.

A pessoa conhecia tanto o assunto, que imaginei ser empresário. Ou então busófilo. Falou de uma série de incoerências quanto a seguro facultativo, que cobre apenas casos de acidente. Assalto, não. Mencionou a legislação vigente, que só contempla extravio ou dano, no caso de bagagem. E me alertou que ações na justiça contra as empresas de ônibus não têm dado ganho de causa a passageiros.

Obviamente, depois da introdução, imputou a responsabilidade ao Estado, dizendo que há muito tempo a sociedade brasileira vem sendo assaltada. Até quartéis do exército.

Sugeriu que eu, e todos, devíamos nos juntar às empresas, para cobrar ações concretas do governo. Detalhou com precisão as péssimas condições da polícia rodoviária. E voltou a comparar a segurança eficiente nos aeroportos com a inexistente em rodoviárias... Falou das péssimas condições das rodoviárias. E mencionou a evidente discriminação para com os usuários de ônibus. E se a própria população nunca queimou aviões, ela queima ônibus quanto se revolta. Finalizou dizendo que a responsabilidade quanto aos assaltos é única e exclusiva do governo. E terminou com um Deus-nos-ajude, assinando logo após: Alex

 

Doutora, Fernanda. A questão é essa, em resumo — cada pessoa, à sua maneira, me dizendo que devo deixar as coisas como estão. Que não há jeito. Que eu me recolha. Que me anule. E estou sendo levado a um conflito interno. Porque a situação não me leva a esse tipo de leitura dos fatos. Eu preciso fazer algo e fazer a coisa certa. Por isso estou aqui, tentando equacionar esse meu sentimento. Quer dizer algo? Ainda não? Se me permite, então, vou continuar.

Não achei que devesse responder a Mário Roberto e Zeli. Só agradeci. Mas quanto a Alex, achei que merecia responder. Posso ler a carta que escrevi? Então vamos lá.

Vejo você lendo meu manifesto e dedicando seu tempo em plena véspera de Natal, num texto bem escrito, que aparentemente parece ter duas laudas. Mas seus 7.418 caracteres representam mais de cinco laudas, na verdade. Muita ponderação, muito conhecimento do problema. E eu fico sem saber dos motivos que o levaram ao aprofundamento na questão. Quem sabe apenas uma questão de cidadania...

De antemão, já lhe digo que não procurarei a ABRATI. Acho que devo limitar-me ao âmbito do usuário apenas. No meu caso, eu disse à REAL REUNIDAS, diante da resposta de que foram igualmente vítimas, que melhor seria estudar o meu caso com mais atenção. Se eles me conhecessem um pouco, numa rápida análise custo–benefício, perceberiam que melhor seria me ressarcir dos prejuízos (estes foram relativamente pequenos). Não tenho a mínima vontade de levantar a bandeira dos empresários do setor de transporte, embora suas ponderações sejam muito esclarecedoras. E acho que embora sejam eles vitimados pelo descaso do governo, eles estão numa situação bem melhor que a minha. Ou eles estão devendo a bancos, com seus bens hipotecados? Acho que não. Transporte terrestre, a despeito das dificuldades, é muito rentável.

Assumir a causa dos empresários me parece situação semelhante à de um passageiro que, vendo meu manifesto, me sugeriu encampar a questão da volta do transporte ferroviário... ou à do motorista que já havia levado oito tiros.

Quando você fala que meu foco está um pouco equivocado, estou convicto de estar despertando algum tipo de sentimento nos usuários. Verifica-se, porém, tratar-se de um segmento de pessoas simples. Devem existir estatísticas que nos digam qual o percentual de pessoas mais esclarecidas, como você e eu, que se valem desse tipo de transporte. Existem pessoas que, de tão simples, ao pegar meu folheto, jocosamente me perguntavam se ensinava a assaltar. Outros perguntavam quanto tinham de pagar pelo folheto. Outros o recusavam, de cara feia, imaginando-me um vendedor impertinente qualquer.

Embora no folhetinho verde eu quase nada diga das ações do governo e da ANTT, quero crer que deixo os passageiros um pouco mais atentos quanto aos seus pertences, quanto a não reagir diante de eventual agressão etc. A menção à REAL REUNIDAS é questão de fidelidade a um fato que aconteceu comigo e sobre o qual posso responder. Não passei por experiências semelhantes em outras empresas, felizmente. Era eu viajando num ônibus da REAL REUNIDAS, num local ermo, com antecedentes, por que não em comboio? As empresas sabem, menos eu, e não dão publicidade.

Antes de imprimir o folheto, eu já havia procurado empresa de rastreamento. Você fala que é muito caro. Eu digo que é muito barato, novamente usando de análise custo–benefício.

Quando você menciona que seguro não cobre perdas em casos assim, fico aqui matutando no porquê de a REAL REUNIDAS ter me telefonado insistindo que eu olhasse na passagem se constava ou não o seguro (acho que ela não tem controle sobre isso). Para que seria? Você menciona reembolso só no caso de “extravio ou dano”. Minha bagagem, salvo melhor juízo, se enquadra nos dois casos.

Em minhas andanças, é curioso e triste saber que, em grande parte dos órgãos com que tive contato, reclama-se da falta de condições. Isso nos leva a meditar sobre a falência das instituições governamentais. Polícia Civil de Cristalina sem pessoal de plantão, se esquivando, encaminhando o caso à Polícia Rodoviária, que afirma não ter poderes investigativos. A ANTT afirmando que não pode interferir no processo, citando apenas a famigerada Resolução 233. A Defensoria Pública afirmando que não sou pobre e por isso não pode me atender. A Promotoria de Defesa do Consumidor afirmando que infelizmente – pasme – o caso não tem relevância social. Empresa de ônibus se dizendo vítima. Assim, só restam os meios judiciais... com advogado, pagando para ver... ou sem advogado, pelo Juizado Especial. Tenho dois depoimentos que me chegaram via internet, em que agentes rodoviários choram as mágoas sobre a situação de penúria da Segurança Pública. E, de forma lúcida, mencionam também a Educação. Também não vou encampar a causa dos policiais rodoviários. Mas o fato de eu mencionar a questão pode repercutir favoravelmente a que alguém dê sequência a essa luta, em várias frentes, por melhores condições.

Pairam dúvidas sobre a quem recorrer para se saber das estatísticas sobre esses assaltos recorrentes na mesma região, sobre como saber do resultado das investigações nas polícias civis dos locais afetados. E pode-se chegar até à conclusão de que, se não existem providências consistentes apesar da falta de condições, haja conivência em vez omissão.

Se estamos desamparados por governo e empresários, vou me ater apenas aos empresários. Separando, na medida do possível, a questão da falta de condições da questão da incompetência explícita desses mesmos empresários.

As informações no bilhete de passagem que tenho, emitido em 2.12.2008, para mim, não são verídicas. Sem contar que meu comprovante de bagagem ainda está comigo [sic]. O bilhete menciona um valor de passagem que é o dobro do que paguei. O trecho que fiz não é o que consta da passagem. O horário de 20h15 não é verídico. Cheguei às 20h00 e o ônibus estava partindo sem mim. Arrolei testemunhas quanto a isso. Não posso concluir, diante disso tudo, que eu tinha seguro, embora não mencionado?

O motorista não conseguia falar com a sua própria empresa depois do ocorrido. Há flagrante omissão (dolosa) em não dizer da periculosidade do trecho ao usuário. Acho que é questão de segurança prevista na falada e resolução da ANTT, aliás, de texto duvidoso, para o que os próprios funcionários [sic] prenunciam mudanças.

Inicialmente eu queria apenas distribuir folhetos explicativos e de utilidade pública na linha que sofreu o atentado. A REAL REUNIDAS não me permitiu entrar no ônibus. Em outros momentos, quiseram me impedir de distribuir panfletos na fila do guichê da REAL REUNIDAS...

Indagada em carta sobre “quantos passageiros se utilizaram da linha BARREIRAS–SANTOÂNGELO no dia do ocorrido”, a REAL silenciou, não informou. Indagada em carta sobre “quantos passageiros possuíam o seguro facultativo”, a REAL também não informou. Seria fundamental esse tipo de informação, pois atestaria o desprezo total a esse detalhe, que, segundo a REAL, é fundamental para garantir os direitos do usuário. E o mais absurdo: a REAL REUNIDAS despreza o fato de que é responsável pelas bagagens. As bagagens que não foram subtraídas foram abertas e seu conteúdo espalhado, tanto no bagageiro, como em campo aberto, para onde foi levado o ônibus. Cada usuário tentou recuperar algo de seus pertences. A retirada das bagagens pelos passageiros não obedeceu a nenhum critério. Nenhum comprovante foi considerado. Cada um levou, dentre as sobras, o que julgou ser de sua propriedade. E a REAL REUNIDAS não se manifesta sobre isso.

Prezado Alex, se existem outros fatores que contribuem para a nossa insegurança, prefiro deixar o meu foco na incompetência da REAL REUNIDAS. Não é o momento psicológico para levantar bandeira de empresários.

Concordo com tudo o que disse quanto ao tratamento diferenciado dado às empresas aéreas e às terrestres. Concordo que a Rodoferroviária de Brasília é uma das piores do país. Sua carta é muito lúcida e possivelmente eu a publique, isso se aceitar. Se não aceitar, posso usar um nome fictício. Acho que todos, você e eu, caminhamos na mesma direção, na triste realidade de assaltos explícitos e de assaltos outros aos nossos direitos de cidadão. Algumas pessoas refletem sobre tudo, outros deixam “a vida me levar...”.

Obrigado pela atenção. Um Natal de muitas reflexões positivas, que nos levem a mudanças internas visíveis, que levem à construção de uma sociedade mais justa e de um mundo melhor. Aristides, 25.12.2008

Vale registrar que já dei entrada no Juizado de Pequenas Causas. E logo vou comprovar se realmente consideram empresas de transporte rodoviário de passageiros como vítimas também. Deixei bem claro  o artifício de que se valem para transportar passageiros em locais em que não há permissão. As empresas usam  simplesmente o artifício de pôr no bilhete que você está indo para um local permitido. Simples, não? No meu caso constou um valor e um trecho que não correspondia à realidade.  Lembra-se do caso do Al Capone? que não conseguiu ser pego pela justiça pelos seus crimes, mas apenas pelo imposto de renda? Quem sabe, quem sabe neste caso também seja por aí. O Al Capone foi para trás das grades, o que importava. 

E quanto às nossas malas, ninguém entende por que as empresas dão comprovantes de bagagem, se não valem nada... A viagem conturbada de 2.12.2008, pela REAL REUNIDAS teve todo tipo de constrangimento. Tiro no corredor. Ameaças de morte. Os passageiros foram ultrajados, roubados em seus pertences – roupas, celulares, relógios, dinheiro em espécie, câmera fotográfica, acessórios e outros objetos de uso pessoal. Um deles (aliás, eu) recebeu uma coronhada na cabeça, por parte de um dos bandidos, oportunidade em que o sangue escorreu pela camisa, calça, ensopando o lenço usado todo o tempo para estancar o ferimento. Era época, diga-se de passagem, em que um torcedor, como foi amplamente divulgado, morreria no Gama-DF por causa de uma coronhada desfechada por um policial. Sinal de que coronhada mata.

A viagem conturbada teve um atraso de sete horas. Os desdobramentos emocionais são ainda imprevisíveis, principalmente no que concerne a crianças e pessoas de mais idade, você sabe, doutora Fernanda. Ao ser interpelada administrativamente apenas quanto aos prejuízos materiais (sem mencionar e sem pretender indenização por dados morais à época), a empresa REAL REUNIDAS declinou do pedido, dizendo-se também vítima. E afirmou que proteger o cidadão é dever do Estado. Você acredita que por pouco o ônibus não partiu sem mim? Até que seria bom, não é mesmo? O bilhete falava em saída às 20h15. Às 20h00, o ônibus estava partindo sem mim. Antes partisse...

O que não é admissível é a REAL não informar ao usuário quanto ao grau de periculosidade que apresenta o trecho entre Cristalina e Catalão. Considerei isso como omissão dolosa. E a publicidade explícita quanto aos termos do seguro facultativo deveria ser seguida de assinatura do usuário que tivesse por desejo seu abdicar do mesmo. Como é possível uma empresa como a REAL REUNIDAS – que viaja sem sistema de rastreamento, sem vigilância armada, com apenas um motorista, e, de forma inconsequente, sem a companhia de outros ônibus em comboio – não dizer dos riscos da viagem ao usuário?! Hoje se sabe que o trecho é eivado de ocorrências de assaltos. Embora tal fato não seja novidade para as empresas, eu, passageiro, não tinha noção. Falta empenho na preservação da integridade do passageiro. Isso é notório.

Indaguei oficialmente sobre “quantos passageiros se utilizaram da linha BARREIRAS–SANTOÂNGELO (esse o trecho completo, passando por Brasília e por S. J. do Rio Preto) no dia do ocorrido”. A REAL silenciou, não informou. Indagada em carta sobre “quantos passageiros possuíam o seguro facultativo”, a REAL também não informou. Seria fundamental esse tipo de informação, pois atestaria o desprezo total a esse detalhe, que, segundo a REAL, é fundamental para garantir os direitos do usuário. O mais absurdo é a REAL REUNIDAS desprezar o fato de que não é responsável pelas bagagens. As bagagens que não foram subtraídas foram abertas e seu conteúdo espalhado, tanto no bagageiro, como em campo aberto, para onde foi levado o ônibus. Cada usuário tentou recuperar algo de seus pertences. A retirada das bagagens pelos passageiros não obedeceu a nenhum critério. Nenhum comprovante foi considerado. Cada um levou o que julgou ser de sua propriedade. E a REAL REUNIDAS não se manifesta sobre isso.

Posso elencar infrações, a meu ver, da REAL REUNIDAS à Resolução 233/2003 da ANTT: artigo 1º (inciso I,alíneas b,h,p; inciso II, alíneas d,j,k,l,q; inciso III, alíneas b,g,j,l; inciso IV, alíneas b,d,k,n,o,p,q).

Não acha que seria obrigação da empresa REAL REUNIDAS, ao dar informações aos passageiros, distribuir panfleto que os orientasse em caso de assalto, principalmente porque é do conhecimento da REAL REUNIDAS o alto grau de periculosidade do trecho Cristalina–Catalão? Se a publicidade do perigo fosse feita corretamente, o próprio passageiro iria tomar precauções, quanto a pertences, quanto a dinheiro no bolso, até quanto ao famigerado seguro facultativo. Daí a importância de se saber quantos passageiros tinham seguro, solicitação que a REAL REUNIDAS simplesmente ignora. Tal atitude pode revelar que nem tenha controle sobre isso.

Foi por causa da inexistência dessas informações que providenciei cinco mil panfletos, às minhas expensas, sobre o ocorrido. No panfleto, orientações aos passageiros quanto a alguns procedimentos básicos em viagem, tais como não reagir em caso de assalto e outros detalhes. O caso do dia 2 de dezembro, envolvendo passageiros da REAL REUNIDAS, foi relatado no informativo. As dificuldades quanto a ressarcimento de bens subtraídos também. Minha intenção era suprir a falta de informação aos usuários de transporte coletivo interestadual terrestre, tão menosprezados em seus direitos.

No entanto, fui impedido pela REAL REUNIDAS de distribuir tal panfleto de utilidade pública dentro do ônibus que passa às 20h15 todo dia em direção a Santo Ângelo.  E a REAL REUNIDAS, igualmente, quis me impedir de distribuir na fila de passagens da empresa, sendo que o informativo de utilidade pública destinava-se a TODOS os usuários da Estação Rodoferroviária de Brasília em várias oportunidades. E nem haveria razão para assim não ser.

Cheguei ao destino com um atraso de sete horas, direto para o pronto-socorro. Muitas pessoas revelaram um grande descontrole emocional no momento do funesto incidente. É bem subjetivo avaliar as repercussões desse trauma no psiquismo das pessoas que foram partícipes do ato de violência, principalmente no que concerne a crianças, pessoas de mais idade e pessoas mais sensíveis. Imagine, doutora Fernanda, você sabe. Ninguém que necessite retornar imediatamente à sua cidade sobe num ônibus de forma descontraída, diante da experiência. Quanto tempo leva para que o fato seja apagado da mente, não se consegue estimar. O que se sabe é que, embora seja dever do Estado manter a ordem e a segurança dos cidadãos, a REAL REUNIDAS poderia e deveria tomar precauções mínimas que garantissem a integridade física e emocional de seus passageiros. No entanto, não o faz. O que ocorreu poderia ter sido evitado. E se a empresa não o faz, a ANTT por sua vez não exige.

Doutora Fernanda, quanto tempo temos? Vou continuar então. A senhora não acredita. Quando mencionei o caso da falcatrua de trechos da REAL REUNIDAS à Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, a ouvidoria da agência  me pediu cópia dos comprovantes – o bilhete, o comprovante de bagagem. Mas parece que é um robô que responde às nossas indagações...  

O robô fala assim: “Esclarecemos que, para a ANTT realizar uma apuração formal e específica dos procedimentos operacionais do caso relatado, é necessário o envio da cópia do bilhete de passagem, por ser esta a única forma de comprovação do serviço contratado e a possibilidade de verificação da linha mencionada”.

Em outro momento o robô assim se manifesta: “A manifestação de V.S.ª está registrada sob o protocolo ANTT/Ouvidoria/2008-134995.  Sobre o assunto, informa-se que a empresa [refere-se à REAL REUNIDAS] não tem autorização desta ANTT para realizar transporte rodoviário de passageiros no trecho Brasília/DF–SJRPreto/SP. A despeito de o usuário não ter encaminhado provas quanto à execução do serviço não autorizado, esta área irá verificar o fato e adotará as providências cabíveis. Em relação ao assalto de que o usuário foi vítima, reiteramos as respostas anteriores. Dentro das ordenanças Administrativas e com base nas competências desta Agência, não há previsão de pagamento de indenização quando a transportadora não tiver concorrido ou dado causa ao sinistro. Qualquer pedido de indenização deve ser encaminhado ao Poder Judiciário, competente para dirimir este tipo de conflito. Por oportuno, colocamo-nos à disposição para sanar quaisquer dúvidas que porventura o usuário apresentar”.

Caramba, doutora Fernanda, eu havia encaminhado as cópias de tudo que pediram, tenho cópias dos e-mails. Mas acho que estavam se referindo ao fato de eu não ter apresentado provas de que ia para minha cidade natal e não para Santo Ângelo, lá nos confins do Rio Grande do Sul. Engraçado! se não fosse triste. Não me contive e disse o seguinte:

“Senhores, não encaminhei provas?! Ah! entendi, esse então é o golpe para levar passageiros de Brasília a SJRPreto – cobrando o trecho maior. E os senhores até parecem desconhecer essa tática...  Vamos às provas. Devo então provar que embarquei em Brasília com destino a SJRPreto? como se os senhores desconhecessem esse artifício? Vamos dar sequência...”.

Não conseguia parar de pensar no Al Capone, preso por sonegação de imposto de renda... Foi quando o robô disse novamente:

“A manifestação de V.S.ª está registrada sob protocolo ANTT/Ouvidoria/2008-134995. A Unidade Regional informou que ocorre fiscalização constante no trecho em questão por parte desta ANTT e que os veículos da empresa que efetuam a irregularidade têm sido sistematicamente multados”.

Perto de perder a paciência, eu me manifestei:

“Tenho condições de obter cópia da multa específica da REAL REUNIDAS? diante dessa denúncia de que eles usaram artifícios ilegais para me levar de Brasília a SJRPreto em 2.12.2008 sem poder? e diante de minha denúncia de que a REAL REUNIDAS pega passageiros na rodoviária de Rio Preto, levando-os de táxi para uma churrascaria na beira da BR para embarque? Soube de outro assalto nesta madrugada no Km 102 da BR-040 às 3h15 da manhã. Dessa vez foi com a Viação Transbrasiliana. Quais as reais providências da ANTT a esse respeito? Estou dando a chance de que os senhores se pronunciem sem vagueza, antes de procurar o Ministério Público com cópia das minhas indagações e das respostas dos senhores. Não acham que já é hora de telefonar-me para uma conversa menos virtual?”.

Foi a última vez que o robozinho da ANTT falou comigo. Ele disse:

“A manifestação de V.S.ª está registrada sob o protocolo ANTT/Ouvidoria/2008-134995. Sobre o assunto, informamos que o acesso aos autos do processo e o pedido de cópias de documentos emitidos pela Agência são prerrogativas do interessado ou seu representante legal, mediante apresentação de procuração emitida por Cartório competente, após autorização do Superintendente da área, conforme Resolução ANTT n.º 55/02, disponível para consulta no site www.antt.gov.br, link Resoluções.  Em relação aos assaltos, comunica-se ao interessado que não é competência desta ANTT, conforme Lei n.º 10.233/02, assuntos afetos à segurança pública”.

Doutora Fernanda, se a gente procurar na web por “assalto a ônibus”, a gente nunca mais viaja, sabia? Experimente.

Então, o que acha? Antes de centrar o meu foco em Ministério Público ou em outra ação judicial contra o Estado ou contra especificamente a ANTT, não acha que preciso de algumas sessões de psicanálise? ou quem sabe uns remedinhos psiquiátricos para diminuir a ansiedade? Talvez baste só a  psicanálise. E eu transfiro minhas angústias para as sessões.  Ou desisto de vez disso tudo. A turma do deixa-disso venceria.

Como???!!! A senhora não é psicanalista? Mas me indicaram a senhora... Mama mia???!!! é  advogada? Sei, sei. Mas na sua visão não é caso da psicologia... é caso de justiça mesmo! E quer pegar a causa? Ufa! Sem querer eu acertei. Muito obrigado! Me deu um alívio. Dê aqui um abraço.

Aristides Coelho Neto, 15.2.2009

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Eis aqui outros textos do autor relacionados ao assunto

“Assalto ao ônibus da Real Reunidas”:

Meu primeiro assalto – a parte péssima

Meu primeiro assalto – a parte boa

Roubo e seqüestro de ônibus perto de Brasília

Peripécias de panfletagem

Todos com planos para 2009

Assalto a ônibus — Diário de um passageiro sem máscara

Aos homens o que é dos homens

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