TEXTOS DO AUTOR

FANTASMAS SEM ÉTICA

Já Gasparzinho, o fantasminha, esse era camarada. Falemos dos outros fantasmas.

Já perceberam, pelo que nos chega pela mídia, que estamos imersos num mar de falta de ética e de decoro? E em que vigora o patrimonialismo? Neste caso, só pra lembrar, as pessoas, na condição de representantes do Estado, se valem do que é do Estado, se valem do que não é seu particularmente, mas de todos nós, para presentear, para retribuir favores, para agradar alguém. As pessoas perdem a noção, não conseguem mais distinguir entre os limites do público e os limites do privado.

Presenteia-se a sogra com um emprego, a manicure com uma cesta básica, presenteia-se um funcionário sem expressão com uma viagem, com um curso no exterior, com uma vaga na garagem, com uma carona personalizada para o filho depois de apanhá-lo na escola, e por aí vai. A essa altura não se sabe mais se os agentes públicos estão usando da discricionariedade ou do patrimonialismo. O certo é que pensam que o erário é a casa da mãe joana. Sem falar do caso dos cargos comissionados que são distribuídos para quem não trabalha, por vício, incompetência ou despudor. Sem falar dos que criam dificuldades para vender facilidades. Ao criar entraves ele é invisível. Para cobrar, ele é fantasma palpável.

Na categoria dos cargos comissionados, existem aqueles de natureza especial. Esses valem a pena, são expressivos em valor, aliás um excelente presente — caridade com o bolso alheio, às vezes para fantasmas intermitentes ou não. Fantasmas de uso contínuo são aqueles que não aparecem no trabalho nem em época de recadastramento. Misteriosamente, já percebemos, recebem salário mesmo sem folha de ponto. Já os fantasmas intermitentes são como aqueles defeitos chatos que a gente tem no carro — aparecem e somem, aparecem e somem. E os mecânicos nunca acham. Mas os piores fantasmas são aqueles que riem dos que trabalham.

Não me venham dizer que não acreditam em fantasmas. Eu tenho um desses na minha sala de trabalho! Pasmem! Fantasmas fazem parte do nosso cotidiano, existem nos três poderes, sem exceção. Estão na Saúde, na Segurança, na Educação, no Planejamento, no Congresso, até na Fiscalização. 

O consolo, dizem, é que essas criaturas voláteis, ou até volúveis, quase não pesam no bolso do contribuinte. Remunerar esses fantasmas — com benesses, salários, gratificações — fica por conta de todos os contribuintes. O prejuízo, então, é rateado por milhões de bobos, como eu e você.

Quando deixarmos de ser bobos e mais participantes quanto aos rumos do nosso país, quem sabe testemunhemos uma grande limpeza ética, naquela acepção em que ética se confunde com moral. Se algum dirigente de alto escalão por acaso estiver lendo... eu não falei, senhores — prestem atenção —, da condenável limpeza étnica, genocídio, que envolve raça. Mas, pensando bem... para a desejada limpeza ética, é preciso ter raça, muita raça!

Aristides Coelho Neto, 4 nov. 2009

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