TEXTOS DO AUTOR

O PADRE QUE ATROPELOU JESUS

Reflexões oportunas, em momento em que a justiça dos homens está de olho em padre que atropelou Jesus e não prestou socorro.

Tudo aconteceu na noite do dia 24, segunda-feira desta semana, na avenida Potirendaba, em São José do Rio Preto, SP. O padre Aparecido Donizete Bianchi foi preso, suspeito de atropelar duas pessoas que estavam numa moto, dentre elas uma que se chamava Jesus. O padre, no entanto, negou estar na direção, negou-se ao teste do bafômetro, não prestou socorro às vítimas e evadiu-se do local do acidente. Testemunhas afirmam que o padre foi culpado mesmo. Por tudo isso, Jesus – o atropelado que saiu ileso – afirmou não perdoar a atitude do pároco. Ribeiro, amigo de Jesus, não teve a mesma sorte, foi parar no hospital com várias fraturas, o que o levou a submeter-se a cirurgia na mesma noite do acidente.

A repercussão do episódio foi grande e ocupou a mídia nos quatro cantos do país. O padre Donizete, que tem antecedentes relacionados a excesso de bebida, colocou desta vez os fiéis em polvorosa — muitos deles correram para a delegacia em socorro ao pároco da catedral de São José. A advogada, Carmem Cury, também ficou numa tremenda saia justa, já que o padre chegou a afirmar que os motociclistas é que avançaram o sinal amarelo, o que complica bastante, já que não havia semáforo...

O bispo, superior portanto do padre Donizete, veio também em defesa do padre. Claro que defender o pároco é atitude cristã. Mas é anticristão não ajudá-lo concretamente na busca de auxílio médico e/ou psicológico se as evidências assim determinarem. 

Regina, amiga lá de Rio Preto, afirmou que achou muito digna a postura do rapaz atropelado. “Além de não o recriminar, disse que é irrelevante o fato de ele ser um padre e que isso pode acontecer a qualquer motorista”, disse Regina. Mas acho que ela se referia ao Ribeiro, o que foi para o hospital. Os jornais, quando falaram de Jesus, o retrataram bem revoltado. A rio-pretense Regina acrescentou ainda: “Veja bem, eu não concordo com ele. Isso acontece mesmo é com motorista imprudente. O atropelamento foi uma fatalidade, mas dirigir embriagado é abuso”. E finaliza: “Ah! o atropelado é Testemunha de Jeová e se dirigia ao culto”.

Embora tudo seja muito sério, em função dos constrangimentos, do sofrimento da vítima que se feriu gravemente, é inevitável tudo soar hilário — um padre, um Jesus. Aliás, um Jesus que não perdoa demonstra  o caráter sui generis da situação.

Ensaiemos agora uma apreciação sobre a nossa condição de cristãos. Não deveria haver diferença de postura entre pastores e fiéis.

Obviamente existe expectativa de que um pastor seja melhor que suas ovelhas. Mas, a partir do momento em que as pessoas se dissessem cristãs, independentemente de serem fiéis ou sacerdotes, todas deveriam agir no mesmo nível de responsabilidade para com a doutrina que abraçaram. Dirigir embriagado seria coisa a se evitar por todo e qualquer cristão, sempre afinado com a moral, com a ética, com a lei — a divina e a dos homens — com o respeito, a responsabilidade, com o exemplo a ser dado. Se um pastor deve dar exemplo aos seus seguidores, estes sempre serão exemplo para alguém. Sabemos que as palavras convencem, mas o exemplo arrasta...

Assim, se um padre recebe muito, seus tutelados recebem muito também. Aquele recebe mais do que estes? Não se preocupem — muito será pedido a quem muito recebeu. Pensemos nisso.

Aristides Coelho Neto, 29.8.2009

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