TEXTOS DO AUTOR

CAMPOS DO JORDÃO, COMO NOS ALPES SUÍÇOS

Nos seus quase 1.700 m de altitude, mais perto do céu, Campos do Jordão é chamada de Suíça brasileira. Temos aqui algo sobre a cidade, sobre a árvore liquidâmbar e o que achei de tudo isso.

Eu tinha estado em Campos do Jordão em 1959, com meu pai. Visitávamos uma amiga dele, em tratamento de tuberculose. Final da década de 50, e o tratamento da doença ainda era ligado à cidade...

Para mim, Campos não tinha muita cor. Acho que pelo fato de minha única lembrança dela ser uma foto em preto e branco que está no meu velho álbum de fotografias. Eu de calça curta, ao pé da escada de uma pensão construída em madeira.

Voltei em julho de 2008. Deparei com uma Campos do Jordão matizada de luzes naturais, com seus exuberantes liquidâmbars multicores, que me fascinam nem sei bem por quê.  Aliás, eu imaginava que era dessa árvore que vinha o melzinho (maple syrup ou sirop d’érable) que ganhei do amigo Manu, quando veio do Canadá. O formato da folha do liquidâmbar faz com que a gente associe imediatamente a espécie à folha-símbolo estampada na bandeira daquele país. Dizem, no entanto, que o que está na bandeira é acer, da mesma família provavelmente.

Ao fundo, liquidâmbars coloridos, que deixam Campos do Jordão parecida com o Canadá - foto acn - jul. 2008Até hoje ainda não sei se plátamo é a mesma coisa de liquidâmbar. “O plátamo é aquela árvore que o senhor viu toda pelada, na avenida principal”, disse o jardineiro matuto, na estrada que leva ao Parque Amantikir. A segunda frase dele me indicou que era mais que jardineiro – era poeta. “O plátamo agora está dormindo, e só acorda em outubro”, arrematou ele, com expressão de quem podia sentir o estado de espírito de qualquer planta.

Pelos três dias que fiquei em Campos, conheci muitos Carlos. Um no centro de atendimento ao turista, dois que se revezavam no balcão do hotel Moinho, onde seria mais lógico encontrar dom Quixote e Sancho Pança. Queria muito ver um esquilo, mas disseram que eles andam raros. Bem, contentei-me com as três seriemas com que deparei na viagem. Também tive o prazer de acompanhar o desfile do preá escurinho atravessando a pista de terra.  Os cachorros de Campos, aqueles que andam soltos na rua, achei mais garbosos que os daqui. Não conheço bem raças de cães, mas acho que cheguei a ver husqui siberiano e akita inu felizes da vida pela rua... Irrelevante isso? Bem, nem vou falar então que vi uma estrela cadente na viagem...

Acho que o mais valeu na estada em Campos do Jordão, além do agito do Capivari, da cervejaria Baden-Baden, do friozinho gostoso, do trem que sempre leva às minhas origens, da música clássica por todo canto, foi a natureza exuberante da Serra da Mantiqueira. A floresta, no seu silêncio, tem música. E sugere vida abundante e plena. Parece guardar segredos inimagináveis, principalmente aquela araucária de mais de quatrocentos anos que pude tocar. Não tenho dúvidas que as árvores, seres vivos que são, primam pela sensibilidade. Mas lá na Mantiqueira eu compreendi que a terra também tem vida. E entendi melhor a frase de Estés (no livro O jardineiro que tinha fé), quando se refere ao seu tio Zovár: “[...] a vida do titio havia sido queimada e arrasada, e mesmo assim ele continuava gentil com as crianças, terno com os animais, e ainda acreditava que a terra era um ser vivo, com suas próprias esperanças, necessidades e sonhos [...]”. A única coisa que Zovár sabia fazer era lidar com a terra. E por isso, sabia lidar com as pessoas. E conseguia ser muito querido.

Engraçado, não é mesmo? Campos do Jordão, com tantas atrações, principalmente a música do Festival de Inverno,  me aproximou das árvores, dos animais e da terra. E voltei de lá imaginando que quem lida com terra tem o mesmo valor de quem lida com música.

Aristides, em 16.8.2008

____________________________________________

Um pouco de Campos do Jordão

Chamam Campos do Jordão de “Suíça brasileira”.  Nos idos de 1825, o brigadeiro Manoel Jordão adquiriu essas terras do Alto da Mantiqueira. E o lugar chamado "Os Campos", passaram a ser conhecidos como "Os Campos do Jordão". Em 1874 as terras foram compradas por Matheus da Costa Pinto. Surgia a primeira povoação.

De estância de repouso – primeira fase — Campos passou a  lugar ideal para tratamento de doenças pulmonares, em função do clima. Estávamos na década de 20. Por força de lei de 1926, Campos do Jordão transformou-se em Estância Hidromineral.

Mas na década de 30, o clima despertou o interesse de empresários de São Paulo, que começaram a investir na cidade com vistas a veraneio (embora “veraneio” tenha origem em “verão”, o veranista prefere mesmo Campos no inverno).  Iniciava-se assim o período de transição de cidade-saúde para cidade-turismo — a segunda fase de Campos do Jordão. Os sanatórios foram afastados do centro da cidade, pelo zoneamento do final dos anos 30. As pensões para doentes também foram proibidas na zona residencial, como garantia de que estes ficassem confinados em hospitais. Podiam então os turistas desfrutar da cidade sem receios de contágio. Era condição para hospedagem nos hotéis a apresentação de atestado de saúde. Alguns hotéis tinham até instalações de raios X. Por força de lei de 1978, Campos passou a denominar-se Estância Turística.

A cura da tuberculose surgiu em 1944. Antes disso a cura estava ligada diretamente ao aumento da resistência da pessoa com repouso, alimentação, clima frio e seco. Conseguindo-se melhores condições físicas, o próprio organismo venceria a doença. Infelizmente, muitos doentes não conseguiam resistir e sucumbiam. Quando apareceram os primeiros medicamentos, o tratamento se estendia por dois anos. E os pacientes eram internados. Hoje o paciente de tuberculose é tratado e curado em seis meses, sem ficar hospitalizado, com raras exceções.

Atualmente os habitantes não gostam que sua cidade seja lembrada como referência de outros tempos na cura da tísica. Preferem a cidade como atração turística, embora ela fique bem deserta em grande parte do ano, o que faz com que o comércio tenha de promover adaptações para sobreviver. A primeira fase da estância, ligada à solidariedade humana, à doença que ceifou tantas vidas, foi decantada de forma romântica por Dinah Silveira de Queiroz em "Floradas na Serra" e descrita de forma realista por Paulo Dantas em "Cidade Enferma".

O avanço da medicina que introduziu o tratamento quimioterápico em doenças pulmonares, tornando secundário o fator clima, bem como a desativação dos sanatórios exclusivamente para tísicos apagaram os últimos vestígios da primeira fase de Campos do Jordão. Hoje a estância vive intensamente sua segunda fase, a do turismo, iniciado há meio século com a construção do Palácio Boa Vista e o surgimento de hotéis de classe internacional. O turismo passou a ser a maior fonte de renda do município. O Parque Estadual – reserva ecológica da Mantiqueira –,  criado em 1941 com o objetivo de proteger o remanescente da mata de araucárias, tem atualmente como meta o ecoturismo. O Festival de Inverno, que nasceu no Palácio Boa Vista, é hoje o mais importante festival de música erudita do país. Para abrigar esse evento de renome internacional foi construído o Auditório Cláudio Santoro e, junto dele, o Museu Felícia Leirner.

Campos do Jordão tem privilegiada localização entre três grandes capitais – São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte.  
A cidade oferece um dos mais belos espetáculos naturais: a geada. O gelo pulverizado embranquece os morros, as árvores e as casas. Quem não quiser ver a geada deve subir a serra na primavera, quando os campos ondulados da Mantiqueira se enchem de flores.

O clima excepcional de Campos, a vegetação exuberante, os espécimes raros de sua flora, os pássaros que habitam suas matas, a água abundante e pura, e a arquitetura alpina introduzida pelo homem, compõem um conjunto de condições notáveis para o turista em busca de lazer e repouso.

Um pouco mais sobre Campos do Jordão

Campos do Jordão 1

Campos do Jordão 2

Campos do Jordão 3

Folhas de liquidâmbar

 

Algo sobre a árvore Liquidâmbar (Liquidambar styraciflua)

Árvore outonal e de folhagem decídua, apresenta modificações nas cores das suas folhas, dependendo da estação do ano, o que a torna bastante ornamental. Mas não é recomendada para o paisagismo urbano posto que as suas folhas, que passam do verde para um amarelo bem definido, depois alaranjado e finalmente vermelho intenso, caem em grande quantidade após atingir essa cor.

Seu nome vem do latim e quer dizer "líquido de âmbar" (resina adocicada amarelo-pálida transparente que rapidamente se solidifica, prestando-se ao artesanato). Graças ao desenho das suas folhas, muitos confundem essa árvore com a Acer (Acer saccharum, o sugar maple), estampada na bandeira do Canadá, e considerada a planta-símbolo daquele país.

 ______________________________________

Nomes populares —  liquidâmbar, árvore do âmbar, carvalho canadense, Sweetgum (EUA).
País de origem — sudeste dos EUA

Porte — árvore de médio a grande porte

Usos — arborização urbana, vasos, bonsai, jardins

Atrativos — coloração outonal

Comentários (3)

Voltar