TEXTOS DO AUTOR

E A COLÔMBIA? FICA NA EUROPA OU NA AMÉRICA DO SUL?

Seje criança, seje adulto, seje qualquer um, seje Sejesmundo, você tem obrigassão de saber que a Kolômbia fica na Hásia, ou seje, encostado na Oropa.

Era intervalo do DF-TV, da Globo, em 6.5.2008. Num comercial de uma universidade,  tive a impressão de que o ator dizia “seje um dos nossos alunos”, ou coisa parecida. Quem estava do meu lado me olhou e perguntou se eu havia ouvido “seje”. Então ficou confirmado – era “seje” mesmo.

Muito provavelmente o texto não seja da universidade. Seja da agência de propaganda. E acho que os sociolingüistas até corroboram; afinal é linguagem coloquial e o que vale, eles dizem, é a comunicação... Mas se você assistiu ao Fantástico de domingo, dia 4.5.2008, não há como deixar de lado uma correlação malvada.

No começo dos anos 70, havia uma brincadeira aqui em Brasília em relação a uma instituição particular emergente. Alguém ligava. E outro alguém atendia. “É da farmácia?” Do outro lado da linha, a pessoa dizia “não”, e declinava o nome da faculdade. De imediato vinha o desculpe-foi-engano de quem ligara.  E no ato a resposta inusitada da atendente: “Não, não! Nada disso! O senhor já está matriculado”.

Quem assistiu ao Fantástico de anteontem ficou preocupado com o desafio proposto pela Globo – 21 crianças de 9 a 11 anos, do sexto ano do ensino fundamental, se submetendo a uma prova igualzinha à aplicada no vestibular da Unigranrio, e conseguindo classificação!

Diz a reportagem que todo ano 5 milhões de candidatos disputam vestibulares no Brasil. As vagas são 2,5 milhões. Só que apenas 300 mil para universidades e faculdades públicas.

Acho que não é preciso explicar mais nada. A disputa pelo aluno que pode pagar, independentemente dos méritos culturais e intelectuais, se transforma em um briga de foice. A ponto de se perguntar num vestibular em que continente está inserida a Colômbia. Se dois é maior ou igual a três. E quem sabe, se quem descobriu o Brasil era homem ou mulher.

Aliás, diante de pergunta do tipo “quem descobriu o Brasil”, se você responder “foi um homem” ou “foi um português”, você está certo.  A pergunta é que está mal formulada.

Voltando, vem daí que para ser advogado no Brasil são necessários dois vestibulares.  O propriamente dito e o Exame de Ordem, da OAB. 

Certa vez uma prima minha, em momento de péssima situação financeira, me ligou pedindo conselhos sobre o que fazer quanto ao seu filho que havia passado na faculdade. Em conjuntura extremamente delicada, o desespero era flagrante.  Como pagar?

Existem milhares de casos assim. Pais desesperados porque o filho, sem a mínima condição, sem nunca ter estudado pra valer, entrou em três faculdades. Particulares, claro. É a ganância dos donos de escola. É a falta de preparo dos alunos recém-saídos do segundo grau (aqui a culpa é do governo), que para encarar uma faculdade com grande concorrência precisariam doar muitas horas de si por dia,  no imprescindível preparo. Ralar, o termo que se usa.

Mas dá vontade de botar a culpa em um monte de gente também. 

Pra quem vive na  miséria absoluta, podemos dizer que a culpa é dos governantes, pouco sensibilizados de que educação é prioridade num país que se preze. Até a alimentação vai influir na aprendizagem. Quem cresce com fome adquire problemas orgânicos que impedem o raciocínio pleno.

Pra quem  tem acesso à tevê e ao computador, já a culpa (além do governo) é de outro monte de gente. Quando a alienação dá lucro, muitos passam a investir nessa direção. Há quem diga que as crianças hoje estão muito condicionadas à seqüência programa–comercial–programa da tevê. E que os professores, para conseguir aumentar o nível de concentração dos alunos em aula, têm de usar recursos aula–brincadeira–aula–piadinha, o chamado recurso “plim-plim” (essa informação tirei de um blog chamado “estamos na m...”, que dentre outras coisas, vai fundo na teoria de que quem assiste muita tevê emburrece). Nessa estratégia de prender a atenção dos alunos, os professores de escolas particulares estão muito na frente. Ganham dos professores tradicionais disparado, porque são mais bem pagos que os mestres de escola pública. Aulas mais criativas, porque bem remuneradas. Estando satisfeitos, podem fazer qualquer tipo de contorcionismo para cativar alunos.

Está provado que quem assiste muita tevê apresenta problemas de concentração. E quem passa muito tempo em frente a telinha lê pouco. Se relaciona pouco também. Chega-se a dizer até que quem vê muita tevê vai ter poucos filhos. A prole enorme dos tempos dos nossos avós é atribuída à falta de televisão... (gostaram da piadinha?)

Obviamente você vai achar correntes pró e correntes contra, no que concerne à influência nefasta da tevê. Há muita gente que assiste à telinha com critério.  Mas passar 16 horas por dia olhando para a televisão com aqueles olhos em espiral não vai redundar em boa coisa.  Como raciocinar? se a tevê o ensina a não-pensar? apresentando tudo mastigado? Por isso que se recomenda dosar tevê e leitura, para que a pessoa não perca a capacidade de refletir, induzir, imaginar. Existem pais bem conscientes. Lamentavelmente outros, às vezes por falta de tempo, deixam a cargo da tevê o papel de babá e educadora.

Voltemos. Daí dizer que o condicionamento (dois parágrafos atrás) prepara alunos para as escolas que tenham vestibulares bem facilitados.  E em grande parte das escolas particulares a regra é não deixar nenhum pagante em potencial fora das salas de aula. “Se vai entrar em qualquer escola, que entre na minha”, diz o dono da faculdade. 

Já que estou desabafando mesmo, lanço a teoria de que o que a geração orkut e msn vai esquentar mesmo são os bancos das escolas particulares.  São os netaholics ou webaholics que, lamentavelmente, além de freqüentar os divãs dos psiquiatras,  só poderão freqüentar escolinhas e fazer vestibulinhos, aqueles em que crianças de 9 a  11 se saem bem. No caso de dependência da internet, o assunto já está sendo estudado por psicólogos e psiquiatras, que aliás dão conselhos pelo www.dependenciadeinternet.com.br  a usuários que desejam simplesmente voltar a usar o mundo virtual “sem prejuízo do que realmente importa: a vida real”. (Revista da Semana, edição 29, 24.3.2008, p. 23) 

Os tais dependentes das facilidades midiáticas usam celular no banheiro, passam mensagens sentados à mesa ou sentados no vaso. Quando não abrem a caixa de e-mails, ficam ansiosos. E quanto às aulas desse grande contingente de faculdades fajutas, mesmo cheias de atrações, não conseguirão assistir nem por cinco minutos. 

Sairão correndo para não perder a novela, ver o seriado na tevê a cabo, entrar na rede para jogar tíbia e outros jogos alienantes (o game tíbia – e similares – não leva a lugar nenhum e vicia mesmo!). Nos intervalos, quem sabe ligar para a secretaria da faculdade, para sondar se o professor vai aceitar “trabalho” no lugar da prova em que se deu mal.

Se não convencer a mamãe ou a irmã para ajudar no trabalho escolar, o jeito é ir para a internet procurar no google quem faça trabalhos finais, teses e dissertações. E geralmente isso se paga com mesada e não com salário, pois quem se ocupa demais com tevê e web não tem tempo para trabalhar e ganhar salário.

A gente falava mesmo do quê? Ah! lembrei. Faculdades. E privadas. Melhor dizer que grande parte do que eu disse é opinião minha mesmo. Tendencioso às vezes? Mas bem-intencionado e desejoso de que as coisas melhorem.     

 

Aristides Coelho Neto, 8.5.2008

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