TEXTOS DO AUTOR

UMA VIAGEM RÁPIDA PELA ACADEMIA

Rápida análise do ambiente da academia e dos acadêmicos de malhação.

Há pessoas que fizeram academia já na infância, antes mesmo do primeiro grau. Parece estranho — como podem pessoas em tenra idade entrar para a academia?! Na realidade ter feito academia sendo criança significa que brincou de amarelinha. Vejam lá no Houaiss: "amarelinha" também é chamada de "academia", regionalismo do Rio Grande do Norte. Quem não brincou disso?

Claro que há outros significados para academia — escola filosófica de Platão, ou de outros filósofos, escola de ensino superior, sociedade ou congregação com caráter científico, literário ou artístico. Academia Brasileira de Ciências, de Letras, por exemplo.

Mas academia também é "local em que se ensinam e treinam várias práticas desportivas ou recreativas". Eu já havia frequentado algumas academias mas, de ginástica, nunca. Academia de preparo físico, é dessa que quero falar um pouco, visão de um neófito que nunca tinha entrado numa. E as pessoas estranham: "Como? Nunca havia feito academia?" Sim, pequei, mas estou tomado pelo remorso e arrependimento. Eu estaria agora num campo minado de "treinamento de vaidades", dizem alguns. Valter Nascimento (falo dele ao final), reportando-se aos gregos, relembra que estes cultuavam o físico com a finalidade de guerrear. Chega ao ponto de dizer que na academia nos preparamos para a guerra também, mas contra o nosso — vez por outra indesejável — próprio corpo.

Nesse local nunca antes frequentado por mim, andei notando que as praticantes exuberantes usam menos roupa que a maioria. As que não são gostosas são mais discretas. Já as que pensam que são gostosas, eu as classifiquei de dois tipos: as que acreditam que são e fim! (Mostram pneuzinhos, celulites e não estão nem aí! Estão certas!) E as que são seletivas no que podem mostrar mais acintosamente. Não tem pernas, não tem bunda? Mostra os peitos, ora bolas, simples assim. Mas quem disse que sei avaliar quando uma mulher é gostosa? As mulheres sempre podem surpreender...

Ao falar de tipos que frequentam academia, não estou fazendo nada de inédito. Muita gente já fez isso. Classificaram os frequentadores em "o focado com a música ou focado só no treino; é discreto, não atrapalha ninguém", "o falante e/ou fofoqueiro, ávido, carente, de fazer amizades", "o marombeiro, que foca no treino, malha pra caramba, mas sempre faz um relatório de como conseguiu aquele corpinho", "o que vai só pra tirar selfie; às vezes posta ali mesmo", "o chamado paizão, que se acha personal trainer, tido como cansativo e inconveniente". Há quem classifique assim de forma vapt-vupt, como o Jaci Caetano: "Os que precisam, os que não precisam e os que não têm mais solução".

O vestuário presente na academia indica ter sido escolhido a dedo, de acordo com a vaidade. Será que vaidade é o pecado capital que mais comparece nesse tipo de academia? Sei não. Bem, tenho posto camiseta e bermuda velhas e ninguém reclama, pelo menos pra mim. Por sinal, me sinto bem invisível. Vamos adivinhar o local por onde todos dão uma passadinha, encolhem a barriga e fazem suas inferências, imaginando quanto perdeu ou ganhou? Responderam "o espelho"? Acertaram.

 Há um questionário inicial para se ter um histórico do recém-chegado paciente, digo, cliente. E a gente fala dos locais onde predominam as dores. No meu caso, falei da dor no ombro, mas escondi a dor na lombar. Tive de confessar depois, não teve jeito. Outra coisa que confessei: não estava entendendo a questão da regulagem dos pesos por absoluta falta de óculos.

Dos meus objetivos, falei que queria movimentar todos os músculos do corpo já que deve haver alguns que nunca movimentei. A resposta a essa dúvida — fosse eu a elucidar — seria internar-me numa máquina de lavar ou betoneira. Perguntei timidamente se na minha idade ainda consigo ganhar massa muscular. Eles disseram que sim! Falaram com opinião firme mas que soa mentirosa. Deixa pra lá.

Pra não perturbar demais o entrevistador na avaliação — e posteriormente o treinador —, deixei de perguntar se há solução para perna fina. Guardei comigo, porque quanto a isso tenho minhas próprias convicções. Acho que é impossível ganhar perna. Haja vista os caras que são bombados em cima e continuam parecendo palafitas embaixo. Há chargistas que caracterizam direitinho esse tipo de atleta — tronco e braços de super-herói e pernas de flamingo. Há quem chame de canela de ema (as minhas, aliás).

Interessante a possibilidade de você, na esteira, afinar seu fôlego à velocidade. Comecei usando 6 km/h, mas fiz alguns ajustes para encaixar no andamento da música ambiente, sempre dinâmica, sempre pauleira. São muitos os usuários da academia que não gostam muito da seleção musical de lá — estão sempre com fones de ouvido conectados ao celular.

Marcelo Câmara faz umas observações interessantes sobre o fundo musical nas academias: "Música é arte para ser ouvida, tocada ou dançada em lugar e momento apropriado. E música ambiente ritmada não se adéqua a um lugar multidisciplinar, onde diversas pessoas devem estar concentradas, executando [...] exercícios de vários tipos, com diversas durações e de diversos ritmos, com distintas finalidades. Alguns alongam músculos e tendões, outros se dedicam a práticas aeróbicas (esteira, bicicleta etc.), e terceiros fazem musculação. A rigor [...], nenhuma música — de excelência, mediana ou ruim, popular, folclórica ou erudita — deveria estar em espaço multidisciplinar, plural, de academia alguma".

Parece que tem gente que percebe e concorda com isso que o Câmara aponta. E faz lá o seu próprio som. Por ver tanta gente ouvindo suas músicas com celular (teclando também), imaginei até que fosse obrigatório usar celular e fone de ouvido. Aliás, se fosse, eu estaria frito — minha orelha não se adapta a nenhum fone de ouvido (defeito congênito meu ou, quem sabe, problema de projeto do headphone).

Assim, no meu segundo dia nessa experiência nova em academia, achei-me um pouco fora do contexto. Felizmente, depois, percebi que havia pessoas (raríssimas, diga-se de passagem) que não usavam celular e nem por isso foram advertidas ou retiradas do ambiente. Lembram-se do jeito que se fazia com os frequentadores indesejáveis dos saloons nos filmes do velho oeste? Voavam pela janela ou pela porta vaivém. Me imaginei sendo despejado por falta de celular. Mas eles poupam quem não usa celular na malhação. Essas pessoas sem celular provavelmente usam agendas daquelas de escrever manualmente, obsoletas iguais à minha. Ah! essa danada da tecnologia!... E as pessoas olhando para a telinha sempre, ou ouvindo música enquanto fazem de tudo, sem prestar atenção ao que acontece à sua volta... O entorno às vezes é a melhor coisa em todos os lugares! Até na academia as pessoas mergulhadas na telinha... Absurdo!

Nesta viagem rápida no observar os costumes "acadêmicos", notei um cara que tinha fone de ouvido só na orelha direita. Pela da esquerda vinha o som bate-estaca do ambiente. Caramba! Ouvir duas músicas ao mesmo tempo é coisa bipolaresca.

Não, neste ano nada vai me fazer desistir da academia! Desta vez vou até o fim! Haja o que houver!

Aristides Coelho Neto, 3 jul. 2019

PS 1 — Por falar em espelho, resolvi — com a academia bem vazia — encolher a minha própria barriga e olhar no espelho. Caramba! Nunca tinha reparado. Quando encolho, aparecem rugas... Isso não estava programado.

PS 2 — Um exemplo de imediatismo ingênuo. O cara depois do exercício para o bíceps, dá uma olhadinha pra ver se aumentou... Hehehe...

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"Em tempos de obsessão pelo corpo ideal, como Platão me ajudou a me preocupar menos com o corpo e mais com a essência." — Valter Nascimento

Caso queira ver o texto completo de Nascimento, vá ao seu blog, onde o autor faz reflexões sobre academia, filosofia e questões existenciais: https://valternascimento.com.br/platao-e-a-academia-de-ginastica-7d32bec839ca

 

 

 

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