— Parece que todo mundo se conhece por aqui. Uma grande família, quem sabe...
— Não é bem assim, uma família... Sendo a cidade pequena, todo mundo sabe da vida de todo mundo. Eles fofocam muito. Falta do que fazer.
— Interessantes os apelidos. Pedro Bigorna, Tonico Caixa D’Água, Morcegão, Pé na Cova, Dita da Merenda... Você chamou o baixinho de Zé do Muro... (risos)
— O Zé do Muro é um cara sui generis. É mestre em reclamar, mas só reclama para a pessoa errada. Com isso fica em cima do muro e de lá não sai. Prefere não polemizar. Só reclama com quem tem intimidade, que geralmente não é a pessoa certa.
— Como assim? Dê exemplo.
— Zé do Muro reclama da linha do ônibus, que o trajeto não atende, que os horários muito menos, que o ônibus não tem manutenção. Tudo isso para o motorista, palavras ao vento. Uma vez foi a Brasília. Levava na ponta da língua uma indignação danada para com os políticos. Desabafou com o porteiro do Congresso. Se a construção de calçadas na cidade deixa a desejar, ele reclama com o Filó Marmita, que fornece as refeições dos operários.
— Ele tem alguma formação?
— Tem, acho que terminou o segundo grau. Escreve direitinho. Tem noção das coisas. Deveria exercer a cidadania da forma correta, botando no papel, indo aos departamentos corretos. Mas é totalmente travado. A batedeira de ovos que comprou no Armazém do Centro apresentou defeito. E ele nunca foi ao Procon. Só reclama pros vizinhos. Parece medo, não sei. Deve ser algum trauma de infância. Ou preguiça mesmo.
— Parece também que se resolvesse as pendengas, não teria mais assunto... Acho que o apelido está errado.
— Como acha que devia ser?
— Zé Poltrão, Zé Bundão. Fica melhor.
Aristides, 22.2.2009
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